Segundo decisão do ministro André Mendonça, há indícios de que Stefanutto exerceu papel de facilitador institucional de grupo criminoso dentro do INSS
Stefanutto foi preso na manhã desta quinta-feira (13/11) em operação da Polícia Federal sobre o esquema de desvios em aposentadorias, em conjunto com a Controladoria-Geral da União (CGU).
No cargo desde julho de 2023 por nomeação do então ministro da Previdência Carlos Lupi, ele foi demitido no dia em que a primeira fase da operação Sem Desconto foi deflagrada, em 23 de abril deste ano. Stefanutto comandou o INSS no atual governo do presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT).
Na decisão que autorizou a prisão nesta quinta-feira, o ministro André Mendonça, do Supremo Tribunal Federal (STF), afirmou que há indícios de que o ex-presidente do INSS exerceu papel de facilitador institucional do grupo criminoso dentro do INSS, primeiro como procurador-chefe, depois como presidente da autarquia.
Segundo o magistrado, na hierarquia da organização, Alessandro Stefanutto "integrava o núcleo político-institucional, que tinha por objetivo garantir o funcionamento e a impunidade do esquema fraudulento, mediante atuação dentro do próprio órgão público".
"Ele utilizou sua influência na alta administração pública para garantir a continuidade da fraude em massa, que gerou R$ 708 milhões em receita ilícita, confirmando sua posição como uma das principais engrenagens da organização criminosa", diz a PF, em trecho citado por Mendonça.
De acordo com os documentos encaminhados ao STF, Stefanutto era considerado peça estratégica para manter ativa a estrutura de desvios, que operava a partir de um acordo de cooperação técnica firmado pela Conafer com o INSS em 2017.
As investigações revelaram que o "pagamento de valores indevidos aos altos gestores do INSS era necessário porque, sem o apoio deles, seria impossível continuar com uma fraude de tamanha magnitude, que envolvia mais de 600 mil vítimas e gerava milhares de reclamações judiciais e administrativas”.
Também de acordo com a PF, Stefanutto avaliava e aprovava a manutenção dos convênios entre o INSS e a Conafer, mesmo após alertas técnicos sobre inconsistências nas listas de filiados e indícios de falsificação de autorizações de desconto. Além disso, ele autorizava o processamento de cadastros de filiação encaminhados pela entidade, sem observância dos critérios legais e sem checagem da manifestação de vontade dos beneficiários.
"Em síntese, sua conduta viabilizou juridicamente o esquema fraudulento, conferindo aparência de legalidade a operações ilícitas, mediante o uso da posição pública de destaque que ocupava no INSS", diz trecho da decisão do STF.
Propina era repassada por meio de empresas
Segundo a Polícia Federal, mensagens interceptadas, planilhas apreendidas com operadores financeiros e ordens de liberação de repasses sem comprovação de filiação reforçam a suspeita de pagamentos sistemáticos ao ex-presidente do INSS.
A PF estima que quase a totalidade dos valores foram pagos entre junho de 2023 e setembro de 2024. Apenas um pagamento foi realizado em 2022. Essa propina foi paga por meio de empresas e até de uma pizzaria, disfarçada como honorários de consultorias ou assessoria técnica. Os investigadores apontaram que esses pagamentos mensais eram feitos por empresas vinculadas ao operador financeiro Cícero Marcelino de Souza Santos, também preso na operação desta quinta-feira.
Mais cedo, a defesa do ex-presidente do INSS afirmou que não teve acesso ao teor da decisão que decretou a prisão dele e que se trata de uma detenção "completamente ilegal, uma vez que Stefanutto não tem causado nenhum tipo de embaraço à apuração, colaborando desde o início com o trabalho de investigação".
O esquema teria desviado mais de R$ 640 milhões entre 2017 e 2023 só via Conafer — sem contar outras entidades também investigadas. A investigação mostrou que as fraudes envolviam falsificação de fichas de filiação, inserção de dados fraudulentos em sistemas do INSS e distribuição de recursos por meio de empresas de fachada e intermediários financeiros.
As investigações da PF e da CGU revelaram um esquema de descontos indevidos em aposentadorias e pensões do INSS, ocorridos no período de 2019 a 2024. No total, foram retirados R$ 6,3 bilhões em descontos associativos.
Os presos na operação nesta quinta-feira foram:
- Alessandro Stefanutto, ex-presidente do INSS;
- Antônio Carlos Antunes Camilo, o "Careca do INSS", figura central no esquema de desvios, que já havia sido preso anteriormente;
- André Paulo Felix Fidelis, ex-diretor de Benefícios e relacionamento com o cidadão do INSS;
- Virgílio Antônio Ribeiro de Oliveira Filho, ex-procurador-geral do INSS;
- Thaisa Hoffmann, empresária e esposa de Virgílio;
- Vinícius Ramos da Cruz, presidente do Instituto Terra e Trabalho (ITT);
- Tiago Abraão Ferreira Lopes, diretor da Confederação Nacional dos Agricultores Familiares e Empreendedores Familiares Rurais (Conafer), e irmão do presidente da entidade, Carlos Lopes;
- Cícero Marcelino de Souza Santos, empresário também ligado à Conafer;
- Samuel Chrisostomo do Bonfim Júnior, também ligado à Conafer.
O que diz a Conafer
Por meio de nota, a Conafer citou o princípio da presunção de inocência após a operação da PF. "A Conafer confia nas instituições e, ao mesmo tempo, exige que sejam respeitados os direitos fundamentais dos investigados", alegou. A entidade também declarou que "é impossível ignorar o contexto político e midiático que envolve esta investigação" e que "os impactos práticos dessa operação já são evidentes e gravíssimos", com a "paralisação forçada das atividades".
"Reafirmamos que a Conafer está disposta a cooperar plenamente com as autoridades competentes para elucidação dos fatos e para que a verdade jurídica se imponha. Entretanto, exigimos que a investigação transcorra com isonomia, transparência e sem espetacularização que prejudique o direito de defesa e o exercício das atividades sociais essenciais", informou.
Ainde de acordo com a entidade, "a utilização de prisões e de exposição midiática como mecanismo de condução política de narrativas é prejudicial ao interesse público e aos milhares de cidadãos que dependem de serviços no meio rural". "A Conafer seguirá acompanhando os desdobramentos e tomará todas as medidas legais cabíveis para garantir a defesa de seus dirigentes e proteger a continuidade dos serviços que beneficiam milhões de brasileiros no campo", completou.
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